David e Jackie Siegel: o consumismo americano sem limites
São Paulo - Em 1970, o americano David Siegel fundou uma firma de empreendimentos imobiliários na garagem de sua casa — uma modesta residência nos arredores de Orlando, na Flórida. Eram anos de muito trabalho, pouco dinheiro e nenhuma extravagância. O negócio prosperou e, décadas mais tarde, se transformou num império de resorts,
spas,
restaurantes e serviços turísticos.
Dos tempos de dureza, Siegel, de 76 anos, não quer se lembrar. Muito pelo contrário. Não foi à toa que ele se tornou uma espécie de símbolo do desenfreado consumismo americano — um tipo de celebridade kitsch. Em 2007, Siegel começou a construir uma mansão inspirada no palácio de Versalhes, a residência dos reis da França entre 1682 e 1789 (o excesso de luxo da vida dos monarcas deu no que deu).
De acordo com o projeto inicial, a Versalhes de Siegel teria 15 quartos, 30 banheiros, dez cozinhas e diversas opções de lazer, como danceteria e rinque de patinação. Quando perguntavam a ele por que queria construir seu próprio palácio de Versalhes, respondia: "Porque eu posso".
A ostentação foi tanta que a vida de Siegel acabou se transformando num dos melhores filmes de 2012, o documentário The Queen of Versailles ("A rainha de Versalhes", numa tradução livre). A rainha em questão é a mulher de Siegel, a ex-miss Jackie, 30 anos mais nova que ele e cuja grande diversão é torrar 1 milhão de dólares por ano em roupas.
Republicano roxo, Siegel costuma dizer que foi o responsável pela eleição de George W. Bush à Presidência da República (para quem não se lembra, Bush ganhou do democrata Al Gore após a polêmica recontagem de votos na Flórida, estado de Siegel). Ele não diz que pauzinhos mexeu.
Tudo ia muito bem até que Siegel quebrou. Seu negócio principal, a Westgate, é uma empresa de time sharing — como são conhecidas as companhias que vendem empreendimentos turísticos em fatias de tempo. No caso da Westgate, um casal pode comprar o direito de passar 15 dias por ano num resort de luxo pagando 25.000 dólares.
Na era do crédito fácil, havia uma fila de gente disposta a assinar contratos desse tipo. A Westgate faturava mais de 1 bilhão de dólares por ano. Mas veio a crise, os clientes pararam de pagar e, afogado em dívidas, Siegel pediu concordata. Mais de 6.000 pessoas foram demitidas da empresa.
Jackie teve de demitir o pelotão de babás que tomavam conta de seus seis filhos (ficou com apenas uma). O jatinho Gulfstream do casal foi tomado pelos bancos e a família foi apresentada às agruras da aviação comercial. Finalmente, a construção de Versalhes foi paralisada e o palácio, colocado à venda.
Mas Siegel se reergueu. Após três anos de fraco desempenho, o mercado imobiliário americano voltou a dar sinais de recuperação e o crédito está irrigando o setor mais uma vez — o que beneficia diretamente a Westgate. A empresa, mais enxuta e bem menor, é hoje bem mais saudável. Siegel diz faturar 500 milhões de dólares por ano e que a empresa nunca foi tão lucrativa. “Abandonamos os bancos e só investimos o que temos condições de quitar com o nosso caixa. Esse é o nosso modelo de negócios atual”, disse o empresário a EXAME.
Apesar do discurso de austeridade, a ascensão, a queda e a nova ascensão do casal Siegel podem ser lidas como uma metáfora da maior economia do mundo nos últimos anos. E a conclusão é: eles não aprenderam nada com a crise. Como não houve ricaço que se dispusesse a pagar 65 milhões de dólares pelo símbolo supremo da ostentação dos Siegel, a mansão encalhou no mercado.
Mas a recente virada na economia também aliviou as finanças do casal, e a família voltou imediatamente aos níveis anteriores de esbanjamento. A propriedade foi reassumida e as obras já recomeçaram. A previsão, agora, é que a casa seja concluída em 2015, quase oito anos após o início de sua construção.
Quando ficar pronta, a mansão será a terceira maior dos Estados Unidos. Perderá apenas para o castelo da família Vanderbilt, construído no fim do século 19, e para a casa de campo do financista Otto Kahn, inaugurada em 1919. Mas, para a alegria dos Siegel, será maior que a casa onde mora o presidente dos Estados Unidos, o democrata Barack Obama.
Durante a última campanha, Siegel enviou a seus funcionários um e-mail recomendando o voto no rival de Obama, Mitt Romney. Sua mansão terá 8.400 metros quadrados, 65% mais que a Casa Branca — mais um motivo para o republicano rei de Versalhes voltar a sorrir.